quinta-feira, 21 de fevereiro de 2013

Anacronismo


(...)   porque foi sua primeira solidão profunda, o
primeiro trabalho íntimo com que elaborou sua vida.

(Rainer Maria Rilke in Cartas a um jovem poeta,
Trad. de Pedro Sussekind)


Uma rua, por P. Bentley




São seis horas.
No ponto do ônibus raios enrubescidos ainda tangem a noite fria. Fios dourados ao vento, a passos largos ele chega.

São seis horas.
Há sorrisos e ternura em abraços repetidos. Olhares umedecidos cruzando-se, de relance, na trepidação da janela.  E o instante, o tempo dirá, era de adeus.




quinta-feira, 14 de fevereiro de 2013

Sobre a face sombria



Dois lados, por  Sergia A.



(...) eu não tenho estética, não busco os temas, os temas me
buscam,  eu tento detê-los mas ao final eles me encontram,
então há que escrever para ficar-se tranqüilo (...)


(Jorge Luis Borges, em conferência sobre criação poética.
Trad. de Wanderson Lima)




Há algum tempo venho resistindo ao impulso de falar sobre esse assunto. Talvez um tempo necessário para o distanciamento que possibilita uma visão do todo, e ameniza os sentimentos que levaram à compreensão de suas diversas faces. Mas, como dizem os grandes mestres, não temos domínio sobre os temas que nos atraem. Ao contrário, somos escolhidos por eles. Então, sem mais fuga, há que se deixar as palavras seguirem seu curso.
 
Sabe-se que o trabalho é um forte componente da vida ativa do homem. E, pode-se dizer que são as atividades produtivas e seu funcionamento que predominam na concepção geral de homem do nosso tempo. O ambiente de trabalho, como um importante recorte do mundo, torna-se assim um bom lugar para observar o comportamento humano. Tive a sorte (sorte?) de trabalhar por trinta anos na mesma empresa, o tempo que chamei de Laboratório. Os altivos consultores de carreira devem estar arrepiados, mas isso não me constrange ou diminui o valor da minha experiência, pois dediquei meu tempo e minhas ações a uma empresa enorme, com uma missão social importante, com várias formas de atuação no mercado, e nos últimos anos com uma grande rotatividade de pessoas. E é justamente na riqueza proporcionada pela convivência com pessoas que se apega o meu delírio nesta noite de clima ameno (benditos sejam os dias de chuva!).

domingo, 3 de fevereiro de 2013

Múltipla


Ah! os poetas,  e suas palavras poderosas invadindo meu silêncio:


Sobre o azul,  por Sergia A.
 



Às vezes sou o Deus que trago em mim
E então eu sou o deus e o crente e a prece
E a imagem de marfim
Em que esse deus se esquece
 
Às vezes não sou mais do que um ateu
Desse deus meu que eu sou quando me exalto.
Olho em mim todo um céu
E é um mero oco céu alto.

(Fernando Pessoa in Deus )